Primeira mulher a exercer a advocacia no Brasil

Myrthes além de defender a emancipação jurídica das mulheres e o voto feminino, também foi essencial no empenho pelo exercício da advocacia por mulheres

No início do século 20, uma importante figura na história da advocacia brasileira exerceu pioneirismo na luta pelos direitos femininos. Myrthes Gomes de Campos não só ficou conhecida pela defesa da emancipação jurídica das mulheres e pelo voto feminino, mas também foi essencial no empenho pelo exercício da advocacia por mulheres.

Myrthes pode não ter sido a primeira mulher a se tornar bacharel em direito, afinal Delmira Secundina, Maria Fragoso e Maria Coelho da Silva Sobrinha já haviam se formado, mas como nenhuma delas havia exercido a profissão até então. ela foi a primeira mulher a exercer a advocacia no Brasil

Nascida em Macaé/RJ, no ano de 1875,  época em que às mulheres era reservado o papel de donas de casa e no máximo trabalhavam como educadoras. Myrthes resistiu, não só se formou em 1898 como passou a exercer a profissão, em um reduto exclusivamente masculino, onde a advocacia era encarada como um ofício “viril”, destinado apenas aos homens.

Difícil ingresso na carreira jurídica
Após a formatura, era necessário registrar seu diploma na Secretaria da Corte de Apelação do Distrito Federal e em seguida obter a inscrição no próprio tribunal. Mas os órgãos colocaram diversos empecilhos no processo. Até mesmo o presidente da corte desconfiava da capacidade das mulheres e aconselhou Myrthes a desistir. Após oito anos, ela conseguiu o registro, contando com a ajuda do amigo advogado Vicente de Ouro Preto.

Também devido à discriminação, enfrentou obstáculos para entrar no quadro efetivo de sócios do Instituto da Ordem dos Advogados do Brasil, o que era um requisito para o exercício da profissão.

Em 1899, foi orientada a ingressar como estagiária, e assim procedeu. Mas logo a Comissão de Justiça, Legislação e Jurisprudência defendeu seu direito de ingressar na carreira, sob a justificativa de não haver lei que a proibisse.

Ainda assim, o requerimento permaneceu sub judice por muito tempo, enfrentando contestações sobre a legalidade, obstrução de pautas de sessões e pedidos de esclarecimentos. Myrthes só conseguiu o ingresso em 1906, após aprovação em assembleia.

Na mesma época, ela teve a chance de atuar como defensora do Tribunal do Júri, tornando-se assim a primeira mulher a exercer a profissão de advogada em um tribunal. O caso chamou bastante a atenção da imprensa. Myrthes conseguiu vencer um promotor considerado imbatível, e o réu foi absolvido. Ela ainda aproveitou a ocasião para fazer um apelo sobre o papel da mulher na sociedade: “É de esperar que a intervenção da mulher no foro seja benéfica e moralizadora, em vez de prejudicial como pensam os portadores de antigos preconceitos”.

Em 1910, Myrthes foi nomeada inspetora de ensino do Distrito Federal. Em 1924, se tornou encarregada pela jurisprudência do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, função que exerceu até 1944.

Ativismo
Logo no início de sua carreira, a advogada foi liderança importante do movimento que defendia o advento do divórcio, à época em que isso era discutido no Congresso pela primeira vez. Por isso, foi muito atacada e acusada de promover a dissolução da família brasileira. A questão do divórcio foi instituída no país apenas nos anos 1970.

Myrthes também foi ativista de congressos operários. À época da elaboração do primeiro Código Civil brasileiro, peticionou uma proposta, formulada pelo Centro das Classes Operárias do Rio de Janeiro, sobre a condição feminina e operária, que foi apresentada à Comissão Parlamentar Especial. O texto sugeria mais liberdade à mulher dentro do casamento, mas foi ignorado.

Ela participou da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, movimento liderado por Bertha Lutz. Myrthes foi oradora do I Congresso Feminista Internacional, em 1922, evento que abriu espaço para a luta pelo sufrágio feminino no país.

Mais tarde, a advogada se tornou colunista no Jornal do Commercio e articulista em vários outros veículos, como a Revista do Conselho Nacional do Trabalho, a Folha do Dia e a Época. Também escreveu diversas obras sobre jurisprudência, que abordaram temas como o direito ao aborto, o voto feminino, o serviço militar e a própria advocacia feminina.

Especula-se que Myrthes tenha falecido em 1965, aos 90 anos de idade, apesar da falta de registros concretos.

Fonte: Conjur

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