Há 48 anos, em 25 de abril de 1974, as portuguesas cortaram suas amarras, com um pensamento libertário, de luta e emancipação, falando a todas as Marias lusitanas de seus direitos igualitários.
Foi um grito reprimido de apoio aos Capitães de Abril, de muitas, as Capitãs de Abril, como define a jornalista Ana Sofia Fonseca em seu livro assim intitulado. Até então, as mulheres, não tinham o direito ao voto irrestrito, não podiam trabalhar e viajar sem consentimento do marido. Todos temiam a figura opressora de António Salazar e a temida Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE). Cabia à mulher ser componente da mãe natureza, como reprodutora, devota da pátria e da igreja católica. Ao homem, era dado o espaço da cultura e das conquistas, desde que não representassem perigo ao Estado tutelador.
Nos anos 1960, quando o feminismo floresceu no mundo, em Portugal, ele também se fez presente. Chegou pelas vozes de ativistas como Leonor Beleza, Etelvina Lopes de Almeida, Nathalia Correa, Helena Roseta, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, com o famoso livro Cartas Portuguesas. A mulher passava a crescer no trabalho externo mais motivada pela emigração masculina do que por seu exercício de cidadania. E a Revolução dos Cravos, inesperada para muitos, surgiu comandada por militares insubordinados dentro das tropas e que foram responsáveis por um momento épico na história de Portugal. Uma revolução romântica, que eclodiu com E depois do adeus, canção premiada em um festival de música. Celeste Caeiro, a florista que ao passar por um soldado e este pedir-lhe fogo para o cigarro, ofereceu-lhe flores. O soldado colocou um cravo no cano do canhão que portava, sendo seguido pelos demais.
Estava nas ruas de Lisboa a Revolução, que no mesmo dia se propagou para todo o país, unindo a nação. Cabe citar aqui as Capitãs de Abril. Mulheres como Dina de Carvalho, esposa do capitão Otelo Saraiva de Carvalho, comandante da rebelião. Ela ajudou o marido a preparar o plano de operações; Manuela Coucello, casada com Ernesto Ferreira Macedo, ideólogo do grupo. Ela datilografou o manifesto, intitulado O Movimento, dirigido às Forças Armadas e à Nação; Aura Costa Martins, que junto ao marido, piloto da força aérea, José Inácio Martins, saiu pela cidade de Lisboa para fiscalizar a calmaria em um carro, portando uma pistola-metralhadora e duas granadas; Maria Teresa Ferreira de Almeida, cujo pai, Eugênio Ferreira de Almeida, era chefe do Estado-Maior da Armada do governo, e o marido, Vitor Alves, um dos líderes da Revolução. Estas e outras dezenas de mulheres não vieram a constar nos anais da História, mas foram protagonistas de um momento histórico.
Portugal atravessou o túnel do tempo e as mulheres radicalizaram. Na Avenida da Liberdade, desceram entoando Grândola, Vila Morena, canção que virou hino da Revolução, rasgando véus e grinaldas, tirando os sutiãs, como símbolo do término da repressão, de uma longa noite de terror. Hoje, a data é comemorada nacionalmente não só pelo fim da ditadura salazariana, mas também pelo que ela representou para as mulheres. Dela adveio uma moderna constituição, com a descriminalização do aborto, com um parlamento que assegura 40% das cadeiras ao sexo feminino, entre tantas outras conquistas. Nos festejos, novamente a população costuma ir às ruas com cravos vermelhos, a pontuar que os ideais de abril não terminaram, mas prosseguem, visto que liberdade é algo pelo qual lutamos todos os dias…