Brigada feminina amplia o combate a violência doméstica em Moçambique

(Foto: Alfredo Zuniga/AFP)

O país ocupa a 127ª posição no índice de desigualdades de gênero da ONU

De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), em Moçambique, cerca de metade das mulheres casam-se antes de atingir a maioridade, 22% são vítimas de violência, mas poucas denunciam. Quantas aqui já sofreram violência doméstica? A resposta é “100%”.

A violência contra a mulher é punida por uma lei de 2011, cuja aplicação encontra resistência, principalmente no campo, e o país ocupa a 127ª posição no índice de desigualdade de gênero da ONU. 

Diante desta realidade, a comunidade de Manica (centro-oeste), resolveu tomar as rédeas da situação com o incentivo de uma associação local, a Lemusica, acrônimo para “Levanta-te mulher e segue o seu caminho”. Assim, juntas ampliaram a participação de uma brigada feminina policial no combate à violência de gênero.

Originalmente criada para revistar mulheres, a brigada feminina foi transformada em uma unidade de combate às agressões domésticas, com a missão de parar imediatamente os agressores, enquanto a polícia chega da cidade. Manica é localizada a uma hora de distância em uma estrada de difícil acesso.

Em cenários possíveis de atuação das agentes, elas chegam a derrubar maridos que agarram suas companheiras e levantam o punho para agredi-las. Ele é interceptado por duas policiais vestindo “capulanas”, o tecido tradicional do país africano e recebe uma saraivada de golpes com paus.

“Antes havia muita relutância por parte dos homens, mas depois de dez anos, à força de conversar, explicar, conscientizar, a violência diminuiu”, diz Elisa Eduardo, coordenadora da brigada.

Lei do silêncio 

A força raramente é usada, a maioria dos conflitos são resolvidos verbalmente. A prioridade é educar e apoiar as mulheres antes de processar os agressores.

Perto do presídio improvisado para onde os companheiros são levados, há uma sala montada para as vítimas, que podem receber tratamento e prestar depoimento sem serem vistas ou expostas a represálias, algo impensável até recentemente.

No campo, o silêncio é a regra e as mulheres que foram estupradas muitas vezes encontram pouco apoio em suas famílias quando decidem denunciar.

“Resultado de um sistema patriarcal que nos educa com a ideia de que as mulheres não têm voz nem poder de decisão e que não fazem nada importante na vida”, denuncia Anchia Anaiva, presidente da Lemusica.

A organização, que acolhe crianças e adolescentes na capital regional, Chimoio, aposta na educação e emancipação, praticamente impossíveis na aldeia.

Vasco Filip, conselheiro do chefe tradicional local, tem opinião própria sobre a missão das mulheres polícias: “é bom que possam revistar outras mulheres, porque podem esconder objetos roubados em locais onde os homens não podem revistar”.

Quanto à violência, “há, mas também há violência psicológica das mulheres contra os homens”, diz. Para a associação, o diálogo é difícil, mas a autoridade dos chefes tradicionais é inevitável, explica Anaiva.

Com discurso feminista, essa militante contrasta com seu entorno. Mas para os citadinos que a veem como uma garota da cidade imbuída de ideias ocidentais, ela lembra que a lei de 2011 “não foi feita pela Lemusica, foi votada pela Assembleia”.

Fonte: AFP

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