Medicina brasileira tem primeira médica com tetraparesia

Para a paranaense, que perdeu a fala e todos os movimentos nas partes inferior e superior do corpo, a formatura em medicina representa uma vitória que vai muito além da conquista acadêmica

Elaine Luzia dos Santos, 33 anos, é a primeira pessoa com tetraparesia a se formar em medicina no Brasil, pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), na cidade de Cascavel. Em 2014, a paranaense perdeu a fala e todos os movimentos nas partes inferior e superior do corpo, quando ainda cursava o terceiro ano. Elaine sofreu um AVC que levou a tetraparesia. Ela precisou reaprender do zero como chegar até a faculdade, como ter uma rotina de estudos e até desenvolver uma relação no atendimento aos pacientes.

Foi através do olhar que Elaine conseguiu superar todas as dificuldades, sem perder a disposição para ir atrás dos seus sonhos, enfrentou e se adaptou à nova realidade. Hoje, o movimento dos olhos é a chave para que Elaine consiga se expressar: ela utiliza uma ferramenta conhecida como prancha alfabética, que forma as palavras de acordo com a forma que ela pisca.

O equipamento foi apresentado por um colega de turma, enquanto ainda estava na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). A ferramenta consiste em uma tabela, dividida em cinco linhas, cada uma contendo um grupo de letras. Para formar as palavras e frases, Elaine pisca quando a intérprete diz a letra necessária para a construção daquilo que quer comunicar.  O modelo original sofreu algumas alterações para otimizar o seu uso no cotidiano.  

O retorno às atividades acadêmicas, em setembro de 2015, não foi uma tarefa fácil. A Unioeste, por meio do Programa de Educação Especial (PEE), acompanhou todo o processo. “Fizemos algumas reuniões com o colegiado e mostramos que ela tinha condições de concluir esse curso. A dedicação dela mostrou que era possível, inclusive convenceu a todos os docentes e os alunos do curso que é possível”, explica Ivã José de Paula, do PEE.

Elaine será a primeira médica do Brasil a se formar com a condição física que apresenta. De acordo com o coordenador do curso de Medicina, o colegiado buscou experiências de outras universidades em situações semelhantes, mas que foi difícil encontrá-las. “Nós fomos atrás de ver essas experiências, mas elas praticamente inexistem, são poucas no mundo com alunos de Medicina. Então, nós mesmos teríamos que ir atrás para resolver a situação”, comenta Araujo.

A fim de se adaptar para as necessidades apresentadas por Elaine, o curso buscou a Assessoria Jurídica para entender os procedimentos legais e as legislações que deveriam ser cumpridas a fim de formar a estudante, que sempre fez questão de participar de todas as atividades acadêmicas, tanto as de cunho teórico, como prático. Além das estruturas adaptadas, como uma sala especial, os procedimentos de avaliação foram remodelados.

Essa é a segunda graduação de Elaine, que também é formada em farmácia pela mesma universidade. Na medicina, a médica passou por diversas fases de adaptação em seu processo de retorno após o AVC.

Durante os anos de graduação, o que mais marcou a estudante foi a relação que ela teve com os pacientes durante as aulas práticas e estágios. “O que mais recordo é o carinho com que os pacientes me tratam. Eles me incentivam todos os dias a continuar”, comenta.

Segundo o coordenador do curso de Medicina da Unioeste, Allan Araujo, Elaine sempre participou de todas as atividades: teóricas, ambulatoriais e de centro cirúrgico. Ela nunca colocou restrições e toda universidade, o Hospital Universitário e servidores colaboraram para a formação.

De acordo com Elaine, seu sonho, a partir de agora, o sonho de Elaine é especializar-se em radiologia. “Eu gostaria de me especializar em radiologia, por ser uma área que eu posso atuar com relativa liberdade, sem depender de muito auxílio. Nessa área de atuação poderei usar meu conhecimento adquirido ao longo do curso, posso fazer diagnósticos por imagens, precisarei apenas de alguém para digitar o laudo”, conta Elaine.

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