Os dados revelam o descaso do atual governo que vem impactando negativamente na vida das brasileiras
Estudo recente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, revela que desde o ano de 2019 o corte em políticas públicas para mulheres, como programas de ajuda a vítimas de violência doméstica, vem sendo uma prática constante no governo Bolsonaro. Medidas que evidenciam um acentuado desmonte nos direitos das mulheres no Brasil.
Segundo o Boletim de Políticas Sociais, publicação da entidade que acompanha, há 20 anos, a execução e implementação de programas voltados à sociedade, o governo iniciou o que chama de “nova política para mulheres”, colocando-as, todas, sob o guarda-chuva dos programas para a família. A pesquisa analisou as ações do governo nos anos de 2019 e 2020.
“Não criticamos investimento em serviços para a família, mas uma política não pode engolir a outra, precisam caminhar juntas”, aponta Luana Pinheiro, técnica de planejamento e pesquisa do Ipea e coautora do estudo. “Essa nova visão do governo tem a perspectiva da mulher apenas dentro de uma família, parte de apenas um tipo de olhar e não engloba outros papéis.”
O estudo aponta ainda que o discurso do governo, pautado em “moralidade religiosa, centralidade da família tradicional nuclear e heteronormativa —ou seja, pai, mãe e crianças—, resgate de valores tradicionais de gênero e embate direto com as pautas e movimentos feministas, também fazem parte do projeto para enfraquecer programas para mulheres.
De todas as políticas que poderiam ser endereçadas à população feminina, o que envolveria não apenas combate à violência mas também ações ligadas a educação e trabalho, a que abocanhou praticamente todo o orçamento foi para o Ligue 180, central de atendimento telefônico do governo que recebe denúncias e dá orientações em casos de violência de gênero.
“Os recursos direcionados ao Ligue 180 representaram 96% do orçamento total liquidado de em 2019. Em 2020, só 25% do orçamento foi executado, e 74% foi para a central telefônica”, explica a pesquisadora Carolina Tokarski, também coautora do estudo do Ipea.
“Nesse segundo ano que analisamos, com tanto dinheiro direcionado a um só programa, sobraram apenas R$ 7 milhões para serem gastos no resto, mas estamos falando de um dinheiro que precisaria ir para o Brasil inteiro, em meio a uma pandemia, quando as mulheres sofreram um impacto imenso”, complementa.
O resultado foi prático: poucos serviços foram inaugurados, inclusive no campo da violência doméstica, e nem a Conferência Nacional de Políticas para Mulheres, que reúne gestores e representantes da sociedade de todo país para traçar planos para a área, foi realizada.
“É a partir dessas conferências que o governo entende quais programas são importantes para a população. Esses encontros existem desde 2004, são realizados a cada três ou quatro anos, o último foi em 2016, e até agora não foi feito um novo”, diz Carolina.
A pesquisadora explica que todos esses pilares entram no conceito de desmonte analisado pelo estudo, já que há várias formas de o governo deixar uma política pública de lado. “Pode deixar morrer, não atualizar, ou fazer isso de maneira simbólica. O que vemos também é uma mudança de área, do foco na mulher para o foco apenas na família”.
De que família o governo fala?
Desde o início da gestão Bolsonaro, sua então ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, que deixou o cargo neste ano para concorrer ao Senado, cita a importância de se priorizar as famílias brasileiras. Por família, porém, entende-se pai, mãe e filhos, o que, segundo as pesquisadoras, representa 40% das configurações familiares brasileiras, menos da metade.
“Essa ideia está muito presente nos discursos das autoridades, mas também está nos documentos do ministério, no material institucional que o órgão usa”, diz Luana. “E há uma ideia de família como se fosse um grande núcleo em que todas as questões pudessem ser resolvidas ali dentro, quando não é assim. Há problemas sociais, estruturais, que vão além desse núcleo.”
Agora filiada ao Republicanos e mirando uma vaga no Senado pelo Distrito Federal, Damares ainda frequenta o Palácio do Planalto. No dia 7 de junho, ela se encontrou com Bolsonaro e com a atual ministra da pasta, Cristiane Britto, na apresentação do trabalho desenvolvido durante a gestão de ambas. Entre as ações do ministério que destacou estava o curso “Casar é Legal”, “uma capacitação para pessoas que desejam obter informações sobre o casamento civil”, segundo explicação do site do MMFDH, e usava uma camiseta com um desenho, em traços delicados, de um homem abraçando uma mulher grávida.
Fonte: UOL